domingo, 25 de outubro de 2009

Jeca Tatu e Sobrenatural de Almeida


No dia 20 de outubro, juntamente com a Biblioteca Municipal, nós, da Academia Passo-Fundense de Letras, promovemos um café literário, lembrando os noventa anos do aparecimento de Jeca Tatu, em livro, e o sexagésimo aniversário de falecimento do seu criador, Antonio Bento Monteiro Lobato. Como sempre, apoiou-nos, o professor Eládio Weschenfelder. Previdente, comecei a preparar minha participação com antecedência, encasquetado com a afirmação recolhida alhures de que Jeca Tatu teria sido retirado de página de Contrastes e Confrontos. Recorri das páginas do grande clássico e nada encontrei.
Ainda mais encasquetado viajei para o Rio de Janeiro, onde fomos recebidos para o chá da Academia Brasileira de Letras na quinta-feira, 25 de setembro. E fui decido a me dar como presente de aniversário, no dia seguinte ao encontro na Casa de Machado de Assis, exatamente uma edição das Poesias Eróticas, Burlescas e Satíricas, de Bocage, à venda na Livraria Rio das Letras, lá, na ex-capital da República.
Na data planejada, localizei a livraria e comprei o livro desejado. Enquanto o livreiro procurava a obra pretendida, estranhamente escondida em meio a volumes pouco poéticos, dei de cara com uma raríssima primeira edição da Obra Completa de Euclides da Cunha (Companhia José Aguilar, 1966), que acabei adquirindo por menos da metade do preço.
De volta ao hotel, dentro do Volume I, numa propaganda amarelada do livro Cartas na Mesa, de Agatha Christie, agora servindo como marcador de texto, antigo leitor gravara a seguinte anotação: Pagina – 182. Vou ao local indicado e lá está a fonte de onde Monteiro Lobato retirou a personagem piromaníaca, o primeiro dos seus três Jecas Tatus.
Voltei ainda mais encasquetado, desta vez com o absurdo da história. Um camarada sai de Passo Fundo decidido a adquirir justo um volume a mil e tantos quilômetros de casa. Lá, encontra a solução para uma preocupação literária, em velha anotação deixada por um desconhecido no interior da rara edição do autor de Os Sertões.
Mal sabia eu que fui conduzido por um personagem revelado por Nelson Rodrigues, após o goleiro do Fluminense defender um pênalti e os dois rebotes seguidos em jogo contra o Flamengo. Pelo visto, Sobrenatural de Almeida, além de apreciador do futebol, era um atilado leitor dos clássicos brasileiros.

Paulo Monteiro

Primer Encuentro Internacional Respecto a las Accciones de Armas Sobre las Costas del Rio Uruguay en la Guerra del Paraguay – Guerra Guazú


A convite do historiador e artista plástico uruguaianense Carlos Fonttes, membro da Academia de História Militar do Brasil, participei do Primer Encuentro Internacional de Historia Respecto a las Acciones de Armas Sobre las costas del Rio Uruguay en la Guerra del Paraguay – Guerra Guazú, realizado em Paso de los Libres, República da Argentina, e Uruguaiana, Brasil. O encontro ocorreu entre 27 e 29 de setembro de 2009, com a participação pesquisadores argentinos, brasileiros e paraguaios. Ao todo, aproximadamente 250 pessoas participaram do encontro.
Ao longo de três jornadas iniciadas no sábado, 27 de setembro, com as atividades protocolares tradicionais, se apresentaram três mesas expositoras. A primeira delas teve como tema “As duas grandes vertentes sobre a Guerra da Tríplice Aliança. Análise da Historiografia Paraguaia”, com exposições do Arquiteto Carlos Von Horoch, do Doutor e Escritor José Luis Acosta e do Licenciado Humberto Trindade.
Segundo os palestrantes duas correntes de opinião consolidaram-se quanto a Guerra do Paraguai, chamada de Guerra da Tríplice Aliança, pelos paraguaios: Lopismo e Antilopismo. Em resumo, os defensores da primeira corrente, em termos simplificadores, têm Francisco Solano Lopes como um herói nacional que procurou construir uma grande pátria, uma nação independente e forte, rivalizando com a Inglaterra. E foi vencido pelo imperialismo inglês, que usou o Brasil, a Argentina e o Uruguai, como instrumentos para destruir a República do Paraguai. Para a segunda corrente Lopes era um caudilho ambicioso, que levou o Paraguai à destruição, numa guerra provocada por sua ambição pessoal desmedida.
A segunda mesa, sob o tema “As Campanhas do Paraguai na Guerra da Tríplice Aliança. Análise das causas do fracasso das campanhas do Sul”, contou com o Licenciado Fabian Chamorro, a Doutora Natália Ántola e Licenciado Edgar Cáceres. Esses estudiosos paraguaios dissertaram sobre as “campanhas do Sul”, que os aliados denominam “invasão paraguaia da Argentina e do Brasil”. Foi o ponto polêmico do Encontro. Seguindo o general brasileiro J. Leal, presente ao evento, também me insurgi, quanto ao “heroísmo” conferido à campanha do Mato Grosso, como é visto pelos historiadores paraguaios.
A terceira mesa desenvolveu o tema “As campanhas defensivas na Guerra da Tríplice Aliança. O Quadrilátero, Curupaiti, Humaitá. Tomada das Cordilheiras. Morte de Lopes e fim da Guerra”. Palestraram a Doutora Grizzie Logan, a Engenheira Adriana Benítez e o Doutor Eduardo Nakayama. Os palestrantes falaram sobre a atuação das forças armadas paraguaias uma vez vencidas nos territórios do Brasil (Rio Grande do Sul e Mato Grosso) e da Argentina (Corrientes e Entre-Rios).
A delegação paraguaia, formada por jovens estudiosos, demonstrou um grande conhecimento da Guerra Guazú (Guerra Grande), como também é chamada. Os palestrantes, especializados em diversas disciplinas, muitos dos quais com cursos de pós-graduação e doutorado no exterior, impressionaram pelos conhecimentos históricos, estratégicos e militares dos acontecimentos bélicos.
No domingo, 28 de setembro, com o apoio de veículos, soldados e oficiais do Exército Argentino, realizou-se estudo de campo no local onde se desenvolveu a Batalha de Yatay, travada no dia 17 de agosto de 1865, entre as forças da Tríplice Aliança e a parte do exército paraguaio que ocupou o lado argentino. Durante mais de quatro horas historiadores argentinos, brasileiros e paraguaios, refizeram, a pé, os percursos das forças em luta. A recuperação dos movimentos militares é extremamente facilitada porque o local está dividido em chácaras. À época da batalha essa divisão já existia. Como as plantas da batalha apóiam-se nas chácaras e ruas a essa restituição é bastante aproximada da situação real do confronto.
Foram apresentadas maquetes, cartas e documentos ainda inéditos em Paso de los Libres. Documentos da época da batalha foram confrontados com mapas de satélites e GPS.
À noite, no salão do Clube Progresso, em Paso de los Libres, palestraram representantes da delegação brasileira.
Paulo Monteiro, da Academia Passo-Fundense de Letras falou sobre a contribuição de Passo Fundo para a guerra contra o Paraguai. Distribuiu um texto, parte de uma série de programas radiofônicos apresentados na Rádio Planalto, em 2007, durante as comemorações do sesquicentenário de emancipação político-adiministrativa da “Capital do Planalto”. Concluiu lendo uma crônica de memória familiar sobre a guerra. Emocionados, os representante da delegação paraguaia admiraram a fotografia do Coronel Chicuta, que liderou o último feito das armas aliadas: a rendição do general Belarmino Cavallero e seus comandados.
Renato Fagundes de Abreu, presidente do Centro Cultural Guarani, de Porto Alegre, falou sobre a importância da Língua Guarani, como elemento de aproximação entre Brasil, Argentina e Paraguai.
Laurindo Souza, presidente da Sociedade Tradicionalista de Uruguaina, emocionou a todos com a declamação do poema “Negra Velha”, de Aparício Silva Rillo.
Na segunda-feira, dia 28, o centro do encontro mudou-se para Uruguaiana. Visitou-se o Centro Cultural Dr. Pedro Marini, onde estão depositados objetos históricos como a espada que Dom Pedro II portava no momento em que os paraguaios se renderam em Uruguaiana. A seguir o Secretário Municipal de Cultura, coronel Brasil Carus, recepcionou os visitantes com um café na belíssima Biblioteca Municipal Luiz do Prado Veppo.
Decidiu-se que os encontros serão realizados anualmente, com alternância entre os países envolvidos na guerra. Em 2010 os pesquisadores encontrar-se-ão no Paraguai para visitarem o Quadrilátero, como denominam os paraguaios, à série de batalhas travadas durante a guerra no solo daquele país.
Apesar das limitações impostas pelo ineditismo desse tipo de evento, revelou-se altamente positivo, pelo fato de reunir pesquisadores de diferentes nacionalidades, influenciados por diferentes e até divergentes concepções históricas.
O conhecimento “in loco” das batalhas revelou-se de suma importância deixando à mostra as limitações do conhecimento histórico tradicional, baseado em textos acadêmicos. A realidade visual dos espaços onde se desenrolaram os acontecimentos bélicos contribui para uma clareza melhor da história enquanto narração dos fatos.

Paulo Monteiro

Galileu é meu pesadelo


Gilberto Cunha é reconhecido internacionalmente como cientista e é um dos escritores passo-fundenses mais brilhantes.
Seus textos, do ponto de vista estético, dentro da limitação conceitual, podem ser divididos em dois grupos: ortodoxamente científicos e heterodoxamente científicos. No primeiro conjunto encontramos livros como os três volumes de “Meteorologia: Fatos & Mitos”; no segundo incluem-se “Cientistas no Divã” e “Galileu é meu pesadelo”, que será lançado na 22ª Feira do Livro de Passo Fundo. Naqueles é o cientista que escreve, nestes é o homem de ciência.
A diferença entre “cientista” e “homem de ciência” transcende a expressão retórica. Todo homem de ciência é um cientista, mas nem todo o cientista é um homem de ciência.
Às vésperas do Natal de 2009 transcorrerá o sesquicentenário de “A Origem das Espécies”, de Charles Darwin, modelo de homem de ciência. O que caracteriza a obra do sábio inglês é a clareza expositiva. E aí está a essência de um homem de ciência. Este é um sábio; o outro é um suja-páginas.
O Autor mesmo o confessa no “Prólogo” que os artigos “Galileu é meu pesadelo”, página 65, e “O olhar de Deus”, página 75, deixam clara a intenção de “trazer à tona a discussão de assuntos que, embora façam parte do dia-a-dia das instituições de CI&I (Ciência, Tecnologia & Inovação), nem sempre são tratados de forma aberta e transparente nos meios acadêmicos e científicos”. Diante da impossibilidade material de comentar o livro “in totum”, examinêmo-los.
Galileu Galilei é uma das mais intrigantes personalidades científicas, por suas descobertas e pela negação dessas descobertas, diante do Santo Ofício. Homem de ciência acabou vítima dos cientistas. A religião é a mais duradoura forma de ideologia. Enquanto ideologia, a religião é a mais duradoura forma de política. Enquanto política, a religião é a mais duradoura forma de administrar a sociedade, no melhor conceito aristotélico. Enquanto política a religião é a mais duradoura forma de poder. E o poder tende ao absolutismo. Assim, faltamente, à corrupção. E a corrupção é a negação do homem.
Se, do ponto de vista científico, a política, seguindo Aristóteles, é a arte de administrar a “pólis”; na prática é a ciência de enganar o cidadão. O homem de ciências é o cidadão em meio à política científica. Na verdade podemos falar em política parlamentar, política literária, política científica, “et caterva”e “ab aeterno”.
Toda e qualquer forma de política gira em torno de um conjunto de círculos sobre círculos, cujo material básico é o segredo pactual. Se a “Liga do Pombo” exerceu papel preponderante na condenação de Galileu, ao longo da história bandos de outras aves até mais perigosas transformam Galileu no pesadelo dos homens de ciência, porque o homem que o cínico Demócrito procurava com sua lamparina pelas ruas de Atenas é a negação do circulismo universal. Charles Darwin que o diga.

Paulo Monteiro

A comunicação na Justiça Brasileira


O Curso de Auxiliar Técnico em Jornalismo do hoje Instituto Educacional Cecy Leite Costa, enquanto existiu, formou toda uma geração de jornalistas passo-fundenses que enriquecem o jornalismo nacional. Muitos deles qualificam os meios de comunicação social do município; outros alçaram vôos para distantes paragens. É uma história que urge escritura.
O sangue e a alma daquele Curso têm nome: Edy Isaías, uma das personalidades mais brilhantes de Passo Fundo. Integrante de uma família de educadores tornou-se o modelo dessa geração de homens e mulheres que colocam a imprensa local entre as melhor qualificadas do país. Se o Professor Edy estivesse fisicamente entre nós, transpirando felicidade, seria o primeiro na fila de autógrafos de “A comunicação na Justiça Brasileira” (PANDION EDITORA, Florianópolis, SC, 2009), do seu aluno Flávio Damiani e da jornalista potiguar Edvânia Kátia, no dia 30 de outubro, sexta-feira, às 18 horas, durante a 23ª Jornada Nacional de Literatura.
Após passar, como repórter e editor, pelos mais importantes veículos de comunicação do Rio Grande do Sul, como Jornal Zero Hora, RBSTV, Rede Globo, Rádio Gaúcha, Rede Bandeirantes e Caldas Júnior, durante oito anos, dirigiu a comunicação do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Tornou-se um dos líderes do Fórum Nacional de Comunicação e Justiça, cuja história resgata, ao lado de Edvânia Kátia, outra condutora dos assessores de imprensa do Ministério Público no Brasil.
A Constituição de 1988 conferiu aos promotores de Justiça uma responsabilidade social importantíssima. Enquanto se sucediam e continuam as denúncias contra integrantes do Poder Judiciário, discutia-se a necessidade de estabelecer um canal de comunicação o mais direto possível entre o Ministério Público e o Judiciário com a sociedade. Entram em cena os assessores de imprensa, organizando-se e predispondo-se a se constituírem nesse canal.
Através de sucessivos encontros procuram criar instrumentos registrado através de diversas cartas. Todo esse processo está registrado em “A comunicação na Justiça Brasileira”.
Do ponto de vista formal, o livro é o histórico de um grupo profissional em busca do reconhecimento próprio, através do fortalecimento das “empresas” em que trabalham. Do ponto de vista essencial, é a documentação de um movimento de opinião, talvez inconsciente, sobre os vícios dos órgãos ligados à Justiça.
As premiações recebidas pelas assessorias de imprensa do Ministério Público Federal e as premiações que suas congêneres de outros órgãos do Poder Judiciário, Ministério Público, Tribunais de Contas e outras entidades afins da Justiça receberam testemunham a melhoria da qualidade dos trabalhos jornalísticos oferecidos. As assessorias de comunicação, por si mesmas, não resolveram problemas antigos, já retratados em obras clássicas do pensamento jurídico social brasileiro, como a introdução a “O Papa e o Concílio”, de Rui Barbosa, mas contribuirão, ao menos, para minimizá-los. Aparar os dentes e as unhas de uma besta-fera indomável, chamada patrimonialismo, já é uma grande vantagem para a sociedade.
“A comunicação na Justiça Brasileira” merece leitura atenta, especialmente daqueles que militam no jornalismo informativo ou mantêm um contado mais íntimo com a área do Direito.

Paulo Monteiro

sábado, 24 de outubro de 2009


Academia Passo-Fundense de Letras encontra Academia Brasileira de Letras no Rio de Janeiro

Paulo Monteiro

A primeira notícia que se tem de idéia de criação da Academia Brasileira de Letras (ABL) é uma ata do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) do dia 6 de junho de 1847. A proposta obteve as simpatias do imperador Dom Pedro II e nobres do Império. Aprovada no dia 22 do mesmo mês, com o nome de Academia Brasileira, acabou esquecida. Três décadas depois, a 24 de maio de 1878, noutra reunião do mesmo IHGB, de novo sob a presidência do segundo imperador, é renovada a proposta de criação, com o nome de Academia das Letras Brasileiras. Também não prosperou.
Proclamada a República, a 15 de novembro de 1989, Medeiros de Albuquerque, diretor da Instrução Pública, retomou a idéia. Pretendia que a Academia Brasileira de Letras fosse patrocinada pelo Governo. Isso aconteceu em 1886. Chegou a elaborar minuta de Decreto, que seria expedido pelo Governo Provisório, nomeando Machado de Assis presidente da Academia.
Lúcio de Mendonça continuou com a idéia de fundar a Academia Brasileira de Letras. Falou com secretários de ministros, os próprios ministros e escreveu artigos expondo a proposta. Chegou até a defender que a Academia Brasileira de Letras fosse fundada a 15 de novembro de 1889. O bom senso fez com que não fosse fundada nessa data. Uma entidade, a nível nacional, para ser verdadeiramente “brasileira” necessitava contar com a participação de intelectuais monarquistas ou ligados ao antigo regime. Sua organização na data que lembrava a queda do Império, inviabilizava a participação do elemento ligado ao governo destronado.
Lúcio de Mendonça não desistiu e a 20 de julho de 1897 foi, finalmente, fundada a Academia Brasileira de Letras. A primeira diretoria estava assim constituída: Presidente – Machado de Assis; Secretário Geral – Joaquim Nabuco; Secretários – Silva Ramos e Rodrigo Otávio; Tesoureiro – Inglês de Souza.
Os primeiros tempos foram muito difíceis para os acadêmicos. Moldada na Academia Francesa, que começou a reunir-se no ano de 1634, e sem um Richelieu para estender as benesses do Estado, os imortais brasileiros passaram a reunir-se nos mais diferentes locais. Aos poucos foram conseguindo o apoio das autoridades constituídas, o que significou um minguado aporte de recursos. Através do Decreto 726, de 8 de dezembro de 1900, a Academia Brasileira de Letras foi reconhecida como de utilidade pública e adquiriu o direito de publicar suas obras através da Imprensa Nacional. A Academia também conseguiu subvenção oficial, o que lhe permitiu pagar um módico jeton aos acadêmicos que participavam das reuniões.
Em 1915 a Academia Brasileira de Letras tinha uma subvenção anual de 15 contos de réis, paga em duas parcelas, o que lhe permitiu pagar um jeton de 20 mil réis por reunião. A situação mudou da água para o vinho em 1917 com o falecimento do livreiro Francisco Alves de Oliveira. Solteiro, deixou toda a sua fortuna, avaliada em cinco mil contos de réis, incluindo imóveis no Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte para a Academia. Em troca, deveria promover concursos literários e premiar escritores. Dois anos depois, Francisco Ramos Paz legou dez contos de réis em apólices com a condição de que os rendimentos servissem para patrocinar prêmios literários.
Logo depois, a Academia viveu largo período de turbulência, devido ao processo desencadeado pela Semana da Arte Moderna. A confusão chegou ao próprio seio do sodalício com a palestra do acadêmico Graça Aranha, em 19 de junho de 1924. As coisas chegaram às vias de fato.
Passado o furacão modernista a bonança retornou à Casa de Machado de Assis, já instalada no Petit Trianon, prédio que lhe foi doado pelo governo francês. Na década de 1960 o presidente Austregésilo de Athayde, que dirigiu a Academia durante mais de trinta anos, conseguiu que o governo da União doasse à instituição um terreno ao lado do Petit Trianon. A parceria com uma imobiliária permitiu a construção de um grande edifício. Hoje ele está integralmente nas mãos da Academia. Os aluguéis são uma importante fonte de renda permitindo a manutenção de uma equipe com mais de cem funcionários, contribuindo para que a Academia Brasileira de Letras funcione como uma verdadeira empresa.
Além de diversas publicações, como a Revista Brasileira, desde 1905 funciona a Biblioteca da Academia possui uma rica biblioteca. O crescimento do acervo, hoje com mais de 70 mil volumes, fez com que ela fosse desdobrada em duas, surgindo a Biblioteca Rodolfo Garcia, moderníssima e aberta ao público.
Guardiã da Língua Portuguesa no território brasileiro, a Academia Brasileira de Letras tem representado o país em todos os acordos ortográficos firmados pelos países que falam e escrevem na língua de Camões.
Conservadoras, mas não reacionárias, fazendo sua a velha máxima do “modernizar conservando”, as academias de letras têm seus próprios rituais, o que tem servido para zombarias de espíritos menos sérios. No caso da Academia Brasileira de Letras é o chá das quintas-feiras, às 16 horas.
No dia 25 de setembro de 2008, uma representação da Academia Passo-Fundense de Letras participou do chá na Casa de Machado de Assis. Integravam a comitiva os acadêmicos Paulo Monteiro, presidente, Santo Claudino Verzeletti, secretário-geral, Helena Rotta de Camargo, presidente do Conselho Fiscal, Jabs Paim Bandeira e esposa, Daniel Viunisky e esposa, Dilce Peccin Corteze e esposo. Além dessas pessoas também confraternizaram com os imortais brasileiros a aluna da Escola Estadual Protásio Alves, Débora de Marco Machado e sua professora, Adriana da Silva, e as professoras Diva de Marco Machado, representando a 7ª CRE, e Rejane Bernardon, da Biblioteca Pública Municipal.
A delegação de passo-fundenses chegou ao número 231, da Avenida Presidente Wilson, no Rio de Janeiro, poucos minutos antes das 15 horas. Eram esperados pelas senhoras Teresinha e Daniela, assessoras da presidência, que promoveram um rápido encontro com o presidente Cícero Sandroni. Enquanto ele participava de uma reunião de trabalho nossos conterrâneos visitaram todas as dependências da Casa de Machado de Assis. Esta recebia levas de pessoas que acompanhavam exposições lembrando a vida e a obra do seu primeiro presidente, cujo centenário de falecimento transcorreria a 29 de setembro.
Logo depois éramos conduzidos à sala onde é servido o chá. Ali, encontramo-nos com diversos acadêmicos, muitos deles saudosos de Passo Fundo. Entre estes podem ser lembrados os nomes do próprio presidente, Cícero Sandroni, do ex-presidente Ivan Junqueira, do poeta Ledo Ivo, do jornalista Murilo Melo Filho e do poeta e romancista Domício Proença Filho, casado com uma passo-fundense. Deve-se lembrar a maneira fraterna com que nos recebeu o poeta Carlos Nejar, um dos gaúchos com assento na Academia Brasileira de Letras.
É opinião unânime dos passo-fundenses recebidos na Casa de machado de Assis, o cavalheirismo com que foram recebidos, e a consideração demonstrada pelos imortais brasileiros por Passo Fundo, o que se deve à respeitabilidade alcançada pelas Jornadas Nacionais de Literatura e os elevados índices de leitura per capita do município.
No domingo, 28 de setembro, nova e calorosa recepção, desta vez pela Academia Petropolitana de Letras e pelo Instituto Histórico e Geográfico de Petrópolis, através do seu presidente Joaquim Eloy Duarte da Silva, poeta e historiador daquela cidade. Mais uma vez pode-se constatar o respeito por Passo Fundo. Ficou acertada para 2009, possivelmente durante a Jornada Nacional de Literatura, a visita de uma delegação de intelectuais petropolitanos.
A conclusão unânime, de tantos quantos participaram dessa viagem cultural é que a imagem de Passo Fundo mudou radicalmente, nos últimos anos. Do discutível e sempre questionado título de “Cidade mais gaúcha do Rio Grande”, hoje somos reconhecidos como a “Cidade mais culta do Rio Grande”. Os próprios diplomas legais que conferiram ao município o status de Capital Nacional e Capital Estadual da Literatura tornam inquestionável esse reconhecimento. E isso é muito bom. Quem investiria numa cidade de boçais? Quem gostaria de visitar ou morar numa cidade de tabacudos? É claro que ninguém.
Como alguém que estuda a história de Passo Fundo há quarenta anos, costumo repetir que a Academia Passo-Fundense de Letras é a herdeira de uma tradição que recua pelo menos até 1883, quando foi criado o Clube Amor à Instrução, que realizava diversas atividades culturais e mantinha uma grande biblioteca para aqueles tempos. Desde 7 de abril de 1938, quando surgiu o Grêmio Passo-Fundense de Letras, do qual a Academia é sucedânea, tudo o que aconteceu em Passo Fundo, culturalmente falando, ou nasceu dentro do sodalício ou foi regado por nossos consócios. O primeiro Centro de Tradições Gaúchas de nossa Região, o telegrama ao presidente Getúlio Vargas propondo a criação da Universidade de Passo Fundo foram gerados dentro da Academia. Os ativistas culturais que idealizaram e dirigem nossos principais eventos culturais amadureceram acompanhando as atividades da Academia. Por isso, a responsabilidade da Academia Passo-Fundense de Letras é muito grande. Somos e continuaremos parceiros para que Passo Fundo se consolide, cada vez mais, como um centro de excelência cultural.