sábado, 24 de outubro de 2009


Academia Passo-Fundense de Letras encontra Academia Brasileira de Letras no Rio de Janeiro

Paulo Monteiro

A primeira notícia que se tem de idéia de criação da Academia Brasileira de Letras (ABL) é uma ata do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) do dia 6 de junho de 1847. A proposta obteve as simpatias do imperador Dom Pedro II e nobres do Império. Aprovada no dia 22 do mesmo mês, com o nome de Academia Brasileira, acabou esquecida. Três décadas depois, a 24 de maio de 1878, noutra reunião do mesmo IHGB, de novo sob a presidência do segundo imperador, é renovada a proposta de criação, com o nome de Academia das Letras Brasileiras. Também não prosperou.
Proclamada a República, a 15 de novembro de 1989, Medeiros de Albuquerque, diretor da Instrução Pública, retomou a idéia. Pretendia que a Academia Brasileira de Letras fosse patrocinada pelo Governo. Isso aconteceu em 1886. Chegou a elaborar minuta de Decreto, que seria expedido pelo Governo Provisório, nomeando Machado de Assis presidente da Academia.
Lúcio de Mendonça continuou com a idéia de fundar a Academia Brasileira de Letras. Falou com secretários de ministros, os próprios ministros e escreveu artigos expondo a proposta. Chegou até a defender que a Academia Brasileira de Letras fosse fundada a 15 de novembro de 1889. O bom senso fez com que não fosse fundada nessa data. Uma entidade, a nível nacional, para ser verdadeiramente “brasileira” necessitava contar com a participação de intelectuais monarquistas ou ligados ao antigo regime. Sua organização na data que lembrava a queda do Império, inviabilizava a participação do elemento ligado ao governo destronado.
Lúcio de Mendonça não desistiu e a 20 de julho de 1897 foi, finalmente, fundada a Academia Brasileira de Letras. A primeira diretoria estava assim constituída: Presidente – Machado de Assis; Secretário Geral – Joaquim Nabuco; Secretários – Silva Ramos e Rodrigo Otávio; Tesoureiro – Inglês de Souza.
Os primeiros tempos foram muito difíceis para os acadêmicos. Moldada na Academia Francesa, que começou a reunir-se no ano de 1634, e sem um Richelieu para estender as benesses do Estado, os imortais brasileiros passaram a reunir-se nos mais diferentes locais. Aos poucos foram conseguindo o apoio das autoridades constituídas, o que significou um minguado aporte de recursos. Através do Decreto 726, de 8 de dezembro de 1900, a Academia Brasileira de Letras foi reconhecida como de utilidade pública e adquiriu o direito de publicar suas obras através da Imprensa Nacional. A Academia também conseguiu subvenção oficial, o que lhe permitiu pagar um módico jeton aos acadêmicos que participavam das reuniões.
Em 1915 a Academia Brasileira de Letras tinha uma subvenção anual de 15 contos de réis, paga em duas parcelas, o que lhe permitiu pagar um jeton de 20 mil réis por reunião. A situação mudou da água para o vinho em 1917 com o falecimento do livreiro Francisco Alves de Oliveira. Solteiro, deixou toda a sua fortuna, avaliada em cinco mil contos de réis, incluindo imóveis no Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte para a Academia. Em troca, deveria promover concursos literários e premiar escritores. Dois anos depois, Francisco Ramos Paz legou dez contos de réis em apólices com a condição de que os rendimentos servissem para patrocinar prêmios literários.
Logo depois, a Academia viveu largo período de turbulência, devido ao processo desencadeado pela Semana da Arte Moderna. A confusão chegou ao próprio seio do sodalício com a palestra do acadêmico Graça Aranha, em 19 de junho de 1924. As coisas chegaram às vias de fato.
Passado o furacão modernista a bonança retornou à Casa de Machado de Assis, já instalada no Petit Trianon, prédio que lhe foi doado pelo governo francês. Na década de 1960 o presidente Austregésilo de Athayde, que dirigiu a Academia durante mais de trinta anos, conseguiu que o governo da União doasse à instituição um terreno ao lado do Petit Trianon. A parceria com uma imobiliária permitiu a construção de um grande edifício. Hoje ele está integralmente nas mãos da Academia. Os aluguéis são uma importante fonte de renda permitindo a manutenção de uma equipe com mais de cem funcionários, contribuindo para que a Academia Brasileira de Letras funcione como uma verdadeira empresa.
Além de diversas publicações, como a Revista Brasileira, desde 1905 funciona a Biblioteca da Academia possui uma rica biblioteca. O crescimento do acervo, hoje com mais de 70 mil volumes, fez com que ela fosse desdobrada em duas, surgindo a Biblioteca Rodolfo Garcia, moderníssima e aberta ao público.
Guardiã da Língua Portuguesa no território brasileiro, a Academia Brasileira de Letras tem representado o país em todos os acordos ortográficos firmados pelos países que falam e escrevem na língua de Camões.
Conservadoras, mas não reacionárias, fazendo sua a velha máxima do “modernizar conservando”, as academias de letras têm seus próprios rituais, o que tem servido para zombarias de espíritos menos sérios. No caso da Academia Brasileira de Letras é o chá das quintas-feiras, às 16 horas.
No dia 25 de setembro de 2008, uma representação da Academia Passo-Fundense de Letras participou do chá na Casa de Machado de Assis. Integravam a comitiva os acadêmicos Paulo Monteiro, presidente, Santo Claudino Verzeletti, secretário-geral, Helena Rotta de Camargo, presidente do Conselho Fiscal, Jabs Paim Bandeira e esposa, Daniel Viunisky e esposa, Dilce Peccin Corteze e esposo. Além dessas pessoas também confraternizaram com os imortais brasileiros a aluna da Escola Estadual Protásio Alves, Débora de Marco Machado e sua professora, Adriana da Silva, e as professoras Diva de Marco Machado, representando a 7ª CRE, e Rejane Bernardon, da Biblioteca Pública Municipal.
A delegação de passo-fundenses chegou ao número 231, da Avenida Presidente Wilson, no Rio de Janeiro, poucos minutos antes das 15 horas. Eram esperados pelas senhoras Teresinha e Daniela, assessoras da presidência, que promoveram um rápido encontro com o presidente Cícero Sandroni. Enquanto ele participava de uma reunião de trabalho nossos conterrâneos visitaram todas as dependências da Casa de Machado de Assis. Esta recebia levas de pessoas que acompanhavam exposições lembrando a vida e a obra do seu primeiro presidente, cujo centenário de falecimento transcorreria a 29 de setembro.
Logo depois éramos conduzidos à sala onde é servido o chá. Ali, encontramo-nos com diversos acadêmicos, muitos deles saudosos de Passo Fundo. Entre estes podem ser lembrados os nomes do próprio presidente, Cícero Sandroni, do ex-presidente Ivan Junqueira, do poeta Ledo Ivo, do jornalista Murilo Melo Filho e do poeta e romancista Domício Proença Filho, casado com uma passo-fundense. Deve-se lembrar a maneira fraterna com que nos recebeu o poeta Carlos Nejar, um dos gaúchos com assento na Academia Brasileira de Letras.
É opinião unânime dos passo-fundenses recebidos na Casa de machado de Assis, o cavalheirismo com que foram recebidos, e a consideração demonstrada pelos imortais brasileiros por Passo Fundo, o que se deve à respeitabilidade alcançada pelas Jornadas Nacionais de Literatura e os elevados índices de leitura per capita do município.
No domingo, 28 de setembro, nova e calorosa recepção, desta vez pela Academia Petropolitana de Letras e pelo Instituto Histórico e Geográfico de Petrópolis, através do seu presidente Joaquim Eloy Duarte da Silva, poeta e historiador daquela cidade. Mais uma vez pode-se constatar o respeito por Passo Fundo. Ficou acertada para 2009, possivelmente durante a Jornada Nacional de Literatura, a visita de uma delegação de intelectuais petropolitanos.
A conclusão unânime, de tantos quantos participaram dessa viagem cultural é que a imagem de Passo Fundo mudou radicalmente, nos últimos anos. Do discutível e sempre questionado título de “Cidade mais gaúcha do Rio Grande”, hoje somos reconhecidos como a “Cidade mais culta do Rio Grande”. Os próprios diplomas legais que conferiram ao município o status de Capital Nacional e Capital Estadual da Literatura tornam inquestionável esse reconhecimento. E isso é muito bom. Quem investiria numa cidade de boçais? Quem gostaria de visitar ou morar numa cidade de tabacudos? É claro que ninguém.
Como alguém que estuda a história de Passo Fundo há quarenta anos, costumo repetir que a Academia Passo-Fundense de Letras é a herdeira de uma tradição que recua pelo menos até 1883, quando foi criado o Clube Amor à Instrução, que realizava diversas atividades culturais e mantinha uma grande biblioteca para aqueles tempos. Desde 7 de abril de 1938, quando surgiu o Grêmio Passo-Fundense de Letras, do qual a Academia é sucedânea, tudo o que aconteceu em Passo Fundo, culturalmente falando, ou nasceu dentro do sodalício ou foi regado por nossos consócios. O primeiro Centro de Tradições Gaúchas de nossa Região, o telegrama ao presidente Getúlio Vargas propondo a criação da Universidade de Passo Fundo foram gerados dentro da Academia. Os ativistas culturais que idealizaram e dirigem nossos principais eventos culturais amadureceram acompanhando as atividades da Academia. Por isso, a responsabilidade da Academia Passo-Fundense de Letras é muito grande. Somos e continuaremos parceiros para que Passo Fundo se consolide, cada vez mais, como um centro de excelência cultural.

Nenhum comentário:

Postar um comentário